"O debate sobre a questão indígena no Brasil recuou pelo menos duas décadas. O direito dos índios à terra tradicionalmente ocupada, tão líquido e certo que terminou consagrado no artigo 231 da Constituição de 1988, volta a ser questionado. Na raiz desse retrocesso está a Terra Indígena Raposa Serra do Sol. O argumento da perda de soberania tampouco resiste ao exame desapaixonado. No mesmo Estado e também na fronteira fica a Terra Yanomami homologada em 1992, seis vezes maior, que nem por isso se tornou uma nação independente. É imperioso resistir a esse retrocesso.
O presidente Lula disse que o governo vai defender no Supremo Tribunal Federal a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Sexta-feira, Lula recebeu integrantes da Comissão Nacional de Política Indigenista no Planalto. E, segundo presentes à reunião, reafirmou sua posição favorável à manutenção da demarcação. "Ele [Lula] garantiu que vai manter a disposição em retirar os arrozeiros", afirmou o cacique Makuxi Jaci José de Souza.
As críticas do general Augusto Heleno à política indigenista do governo foram apoiadas sexta-feira por partidos de oposição e até mesmo da base aliada. "O governo busca silenciar o comandante militar da Amazônia com o objetivo de enfraquecer a posição de todos os que defendem a revisão da política indigenista do governo, porque ela implica ameaça à segurança nacional", cobrou em nota o presidente do DEM, deputado federal Rodrigo Maia (RJ).
A exemplo do que fez semana passada, o presidente da Funai, Márcio Meira voltou a criticar o general Heleno. Para ele, o general desconhece o papel dos índios na formação das fronteiras do Brasil, principalmente na Região Norte, onde hoje se discute a homologação da Raposa Serra do Sol. O presidente da Funai lembrou que, na década de 70, o país tinha 250 mil índios e hoje tem quase um milhão. "Isso é resultado de uma política indigenista que garantiu a sobrevivência dos índios. Dizer que a política indigenista é caótica é desconhecer a política indigenista. Está mal informado", disse Meira
A Polícia Federal vai usar a Lei de Segurança Nacional contra os plantadores de arroz que lideraram as últimas manifestações em Roraima contra a exigência de que deixem a Terra Indígena Raposa Serra do Sol. A PF abriu cinco inquéritos para apurar os fatos, classificados pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, como terrorismo. A investigação da PF deverá enquadrar as principais lideranças da região em formação de quadrilha.
Supremo Tribunal Federal foi um claro exercício de prudência e de responsabilidade. É uma decisão provisória, que não tem caráter definitivo. O STF ainda vai julgar a causa principal, que envolve uma questão gravíssima: a integridade da soberania nacional versus o princípio federativo", disse Celso de Mello. Relator das ações referentes à Serra do Sol, o ministro Carlos Ayres Britto, ao ser questionado sobre as declarações de Tarso, disse que "é preciso atentar que a área (onde há conflito) é de apenas 1% da reserva" e que no restante os não-índios já foram retirados sem violência
A polêmica em torno da Terra Indígena Raposa Serra do Sol não envolve apenas a questão dos grandes produtores de arroz que se recusam a deixar a região. O subsolo da área, com 1,7 milhão de hectares, também é rico em minérios - fato que desperta interesses de empresas nacionais e internacionais e movimenta o Congresso. Existe um grupo suprapartidário trabalhando intensamente para a aprovação de um projeto que libera a mineração em terras indígenas de todo o País. Eles querem aprová-lo neste ano, com apoio do governo.