É lamentável ver a maioria dos nossos representantes (senadores, deputados federais, deputados estaduais e outros representantes) concentrarem todo o esforço para apoiar a permanência dos arrozeiros na Terra Indígena Raposa Serra do Sol junto ao quarto poder (mídia local).
Além disso, é lamentável também a gente ver a Prefeitura de Pacaraima sendo usada como instrumento que reforça a ação pró arrozeiros e anti-indígena, quando desativa as secretarias municipais do índio, meio ambiente e turismo, demite sem justificativa mais de 80 pessoas que estavam trabalhando para a melhoria de vida da população. Ver o prefeito transferir médicos com mais de 15 anos de serviços prestados às comunidades indígenas e a população do município (transferiu porque não pode demitir por serem servidores federais e/ou estaduais). Ver todos os serviços prestados pela Prefeitura de Pacaraima prejudicados, deixando de lado as pessoas que mais necessitam dos serviços públicos, em função de interesses particulares e econômicos de poucos. Os problemas estão lá para quem quiser ver!
E onde estão nossos representantes? Se solidarizando em defesa do direito de uma minoria.
Alguém vai ao município para saber como vai o atendimento nas escolas, no hospital? E a limpeza urbana? As obras que estavam em andamento, o atendimento de saúde às comunidades indígenas, o que foi pactuado está sendo cumprido?
Os índios contam com quem no nosso Estado?
É espantoso ver que, em defesa da permanência de cinco arrozeiros dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, vem crescendo dentro do Estado (recheado de xenofobia) manifestações favoráveis. É muito estranho não ter acontecido esse tipo de manifestação por parte da classe política e da imprensa, quando a três anos atrás, por ocasião da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, famílias inteiras que residiam na região do Surumu (Zé do Hangar - meu pai, Zeca Pereira, Mimi Madeira, Lázaro Madeira, Dodó Madeira, Severiano Moraes, Osvaldo Almeida, Luciano, Zé Augusto, João da Silva e muitos outros) SAIRAM sem o barulho que vemos hoje. Uns recebendo indenizações consideradas injustas e vínculos que não cabe indenização. Não se viu, a época, tamanho empenho dos nossos parlamentares e legítimos representantes, manifestação em defesa das famílias tradicionais que ajudaram a construir nosso Estado e que fazem parte da história de Roraima. A maioria dessas pessoas não vieram de outros estados, não destruíram o meio ambiente, não queimaram pontes, não utilizaram bombas, nem formaram quadrilhas, são pessoas do BEM, da PAZ. A região do Surumu, onde passei toda a minha a infância, nunca havia passado tamanho conflito, fomentado e introduzido em nome de um pseudo “Desenvolvimento” como se esse grupo fossem os únicos capazes de produzir alimentos. Até parece que ninguém comia arroz antes deles invadirem a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, como se fossem os únicos a ter direto a terra. Mas os fatos por si só mostram que vem “produzindo” desgraça às pessoas, aos recursos naturais, com um modelo ultrapassado de que só desrespeitando o outro e a biodiversidade fosse possível produzir alimento. É evidente que quando essas áreas onde estão forem totalmente destruídas e não produzirem mais, eles irão em busca de outras, pelo Brasil afora. Como aqui é a última fronteira, e eles já vêm do sul, quem a sabe vão a Venezuela, Guiana por que Pátria é o dinheiro e em nome do “desenvolvimento“ vale tudo.
Estamos presenciando um lastimável e decepcionante posicionamento da maioria de nossos representantes na defesa enfática de cinco arrozeiros, ou melhor, na defesa da embrionária elite agrária e econômica do nosso estado. Defendem a permanecerem dessa elite em uma terra indígena homologada de acordo com a constituição do nosso país. Não que eles estejam defendendo os não índios, e o desenvolvimento do nosso estado, mas manifestando em prol de uma um única causa a ”permanência dos arrozeiros”.
A terra indígena é patrimônio da União, é mais Brasileira e o povo brasileiro e Roraimense é um povo pluriétnico. É oportuno lembrar aos nossos representantes, que no período eleitoral precisarão de votos de todos os índios, não índios e todos, estão amadurecendo politicamente. Não bastarão promessas, presentes e uns trocados vai ser preciso compromisso com o futuro, atitude, ação. Os discursos só já não bastarão e não vale apostar que o povo tem memória curta, pode não colar! Não subestimem a capacidade dos indígenas em vira o jogo, seus vínculos sociais são mais extensos do que a ambição e o egoísmo pautado em um discurso neo nacionalista de patriotismo, progresso e desenvolvimento.
Como diz Roberto Carlos “não sou contra o progresso, mas apelo pro bom senso um erro não conserta o outro isso é que eu penso”.
Mônica Regina Nascimento de Freitas é Bacharel em Ciências Sociais com habilitação em Antropologia, Especialista em Gestão em Etnodesenvolvimento e roraimense
Folha de Boa Vista, 31/05/2008, Opinião.